Deficit bilionário e medidas arbitrárias do governo preocupam participantes do fundo de pensão do pessoal da Caixa, o terceiro maior do país
No dia 15 de julho de 1977, foi criada a Fundação dos Economiários Federais, a Funcef, fundo de pensão dos trabalhadores da Caixa Econômica Federal. O ato ocorreu duas semanas após a publicação da Lei nº 6.435/77, que regulamentou a previdência complementar no país. Tamanha tempestividade mostrava a importância atribuída aos fundos de pensão naquele momento. Desde então, muita coisa mudou e a Funcef chega aos 42 anos lutando contra um déficit bilionário e tentando se libertar da excessiva concentração de recursos em investimentos de menor rentabilidade.
A fundação é a terceira maior do Brasil e uma das maiores da América Latina, com cerca de 134 mil participantes e um patrimônio administrado de R$ 68 bilhões. Com um deficit acumulado de R$ 6,2 bilhões, a fundação é sólida, mas deixa em frangalhos o bolso dos participantes que estão pagando equacionamento. Para 56 mil deles, os descontos chegam a 20% da renda mensal. Embora a resolução nº30 do CNPC permita a revisão e diluição das contribuições extras, a gestão do fundo de pensão ainda não tomou a iniciativa da revisão.
“Todo o patrimônio administrado pela Funcef é dos participantes e devemos nos orgulhar disso. Ao mesmo tempo, precisamos cobrar dos gestores mais sensibilidade quanto à forma de cobrar o equacionamento”, observa a diretora de Saúde e Previdência da Fenae, Fabiana Matheus.
É preciso mudar os investimentos
Nos últimos anos, a Funcef concentrou investimentos em renda fixa e baixou bruscamente a meta atuarial, desequilibrando ainda mais os planos de benefícios. Com a baixa rentabilidade dos títulos públicos, a Funcef colhe frutos mais modestos do que necessita e se vê obrigada a rever sua atuação. A política de investimentos aprovada em março para o quadriênio 2019-2023 mantém a concentração em renda fixa e a diminuição dos investimentos estruturados, entre os quais estão os FIPs, o que não condiz com a realidade.
Com o deficit crescendo 19,5% desde dezembro de 2018, a diretoria se viu obrigada a reconhecer a renda variável e os FIPs como saídas para o problema. Afinal, os investimentos estruturados tiveram valorização média de 22,14% no último ano, quase o triplo dos títulos públicos. No entanto, a alocação média de recursos nessa modalidade mais rentável é de apenas 4%. Somente no Novo Plano, cerca de 70% dos ativos estão em renda fixa.
Para além dos problemas, a Funcef é referência nacional e representa um capítulo importante da história dos movimentos sindical e associativo, com muitas conquistas em prol dos trabalhadores, algo que não pode ser esquecido.
Conquistas com a mobilização dos trabalhadores
Quando a Lei Complementar nº 108/01, determinou que os conselhos deliberativo e fiscal dos fundos de pensão tivessem composição paritária entre representantes dos participantes e dos patrocinadores, se iniciou a democratização da Funcef. Até então, os participantes eram meros expectadores, sem atuação nas decisões de gestão.
Os representantes eleitos passaram a integrar o Conselho Deliberativo, com três vagas, e com isso têm espaço igual aos indicados pela patrocinadora nessa que é a instância máxima de decisão do fundo de pensão. Já no Conselho Fiscal, onde existem quatro assentos, os trabalhadores elegem dois representantes.
A legislação dos fundos de pensão não prevê a paridade na composição da diretoria executiva das fundações. Foi aí que os trabalhadores da Caixa se mobilizaram e conquistaram outra vitória. Em 1º de agosto de 2007, há exatos 12 anos, foi aprovado o novo Estatuto da Funcef, com a previsão da paridade na composição da diretoria e previsão de escolha dos representantes dos trabalhadores por meio de eleições diretas. Naquele ano, os participantes elegeram três diretores.
Outro avanço importante foi a definição de limites para o uso do voto de minerva, cuja prerrogativa é do presidente, que no Conselho Deliberativo e na Diretoria Executiva é indicado pela Caixa e no Conselho Fiscal, é eleito pelos participantes.
“Não há avanço sem mobilização. O que os trabalhadores conquistaram até hoje foi por meio dessa postura de lutar pelo que é melhor para o nosso futuro. É esse espírito que precisamos manter”, lembra Fabiana Matheus.
O uso do voto de Minerva é vedado para alterações no estatuto, alterações em regulamentos, retirada de patrocínio e aprovação de investimentos acima de 2% dos recursos garantidores.
Direito à aposentadoria ameaçado
Outra questão que assombra a previdência complementar do pessoal da Caixa é a resolução CGPAR 25, publicada pelo governo federal no ano passado. A resolução recomenda mudanças que trarão prejuízos aos participantes do Não Saldado, tais como a desvinculação do reajuste dos benefícios dos assistidos em relação ao reajuste do pessoal da ativa e desvinculação das complementações/suplementações de aposentadorias do valor do benefício pago pelo RGPS.
A CGPAR 25 também propõe a excluir dos regulamentos a previsão de percentuais de contribuição e a adoção da média de, no mínimo, os últimos 36 salários de participação para o cálculo do benefício, teto para salário de participação não superior à maior remuneração de cargo não estatutário e fixação de 8,5% da folha de salário de participação como teto para contribuição normal do patrocinador a novos planos.
No caso da Funcef o plano ameaçado é o Reg/Replan Não Saldado é o mais diretamente ameaçado, mas todos os outros planos, de alguma forma, podem ser atingidos. Porém, como a diretriz apresentada à Caixa pela CGPAR diz que a proposta de alteração de regulamentos deverá estar aprovada na governança interna da entidade, a Funcef precisa aprovar a alteração em votação no Conselho Deliberativo. Como o estatuto da Funcef não permite o uso do voto de minerva para essa finalidade, tudo dependerá do quarto voto, ou seja, de ao menos um voto de representante eleito.
Olhando para trás, são muitos avanços que foram obtidos a partir da mobilização dos trabalhadores. Desde o Fundo de Revisão de Benefícios (FRB) – mecanismo que permitiu aumento acima da inflação para milhares de participantes após o período de reajuste zero para os aposentados durante os anos 90, até as longas negociações para que a Caixa pagasse a dívida do chamado serviço passado trazendo recursos que permitiram ajustes nos planos de benefícios, tais como a adequação aos institutos de Portabilidade, Benefício Proporcional Diferido, Auto Patrocínio e Resgate. A retirada do limite de 55 anos de idade para a concessão de benefício programado de renda vitalícia e a alteração da tábua de mortalidade para adequar as reservas ao novo perfil etário dos participantes também foram resultado da atuação dos trabalhadores nesse processo democrático.
Neste momento, mais do que nunca, trabalhadores ativos e aposentados precisam estar unidos em defesa da Funcef, para cobrar outra postura de seus gestores quanto ao equacionamento, para impedir que a implementação da CGPAR 25 tenha os votos necessários a sua aprovação e para que a fundação continue a trabalhar em prol das necessidades e anseios dos participantes.